Folha de São Paulo

Instrumentistas usam vocais em novos álbuns

por: Carlos Calado
03.01.2007

Violonista Mario Adnet e o baixista Zeli contam com participação de cantoras:
Mônica Salmaso, Simone Guimarães e Badi Assad contribuem com novos timbres sonoros e ajudam a ampliar o público.

Dois lançamentos de música instrumental brasileira revelam que compositores e arranjadores desse gênero estão incluindo cantores em seus trabalhos. Não se trata, propriamente, de um paradoxo: além de enriquecer composições e arranjos com outros timbres sonoros, esse recurso contribui para a ampliação da platéia da música instrumental.
"A voz é um instrumento que aproxima mais a música do ouvinte", diz o violonista e compositor carioca Mario Adnet, 49, que acaba de lançar um álbum instrumental com dez composições próprias, além de arranjos de peças de Claudio Santoro ("Paulistana nº 1") e Camargo Guarnieri ("Dança Negra").
"Quando se ouve a voz misturada com o instrumento, há uma comunicação maior. A voz esquenta o som instrumental de um jeito que a pessoa ouve mais facilmente", analisa Adnet, que usa a própria voz em algumas faixas do CD, além de contar com vocais sem palavras da cantora Mônica Salmaso.
"Mvsica" é o primeiro lançamento do selo Adnet Mvsica, que também está sendo distribuído nos EUA pela Adventure Music. "Considero este disco 100% instrumental. Apesar de incluir vozes, as músicas não têm letras. Adoro voz misturada com instrumento. Sempre gostei desse timbre", comenta o violonista.

Zeli e Assad
O baixista e compositor paulista Zeli, 38, também utiliza vocais no álbum "Em Movimento" -caso de seu arranjo do clássico choro "Doce de Coco", com participação da cantora Badi Assad. E vai mais adiante em seu namoro com a música vocal: inclui também três canções que compôs em parcerias com as cantoras Simone Guimarães e Taciana Barros.
"Gosto tanto da canção como das improvisações da música instrumental e do jazz. Faço essa junção por gosto pessoal, mas isso também não deixa de ser uma tentativa de despertar o interesse dos ouvintes para a música por meio das letras", conta o baixista, que já gravou cinco álbuns como integrante do grupo Terra Brasil, também instrumental.
Nesse seu segundo álbum solo, Zeli também exibe talento como arranjador, recriando composições instrumentais de Moacir Santos ("Amphibious") e Garoto ("Desvairada"), além da popular canção "Nascente" (Flavio Venturini e Murilo Antunes). "Acho que a canção já foi bastante explorada, mas ainda existem outros caminhos. Ainda há muitas misturas a se fazer com ela, seja com elementos jazzísticos, seja com música de raiz", observa.
Os elogiados arranjos que fez para obras de Moacir Santos, nos álbuns "Ouro Negro" e "Choros e Alegrias", além do projeto "Jobim Sinfônico", aumentaram a responsabilidade de Adnet como compositor.
"Arranjar ficou mais fácil, mas compor ficou mais difícil. Tenho que caprichar mais do que antes", afirma o violonista, que compôs a bela "Do Coração" para esse álbum, além de ter finalizado algumas composições mais antigas.

Melodia no museu
Ao comentarem a cena atual da música, na qual o ritmo tem sido cada vez mais valorizado, Adnet e Zeli também revelam afinidades. "A música que a gente aprecia, com melodia e harmonia, está virando peça de museu. Tem lances rolando por aí, como esse funk das favelas do Rio, que quase não têm mais a ver com música", diz Adnet.
"Não acredito em música criada com apenas um elemento", afirma Zeli, ressaltando que harmonia e melodia são tão fundamentais quanto o ritmo.
Ele e Adnet, cada um a seu modo, estão contribuindo ativamente para que a música instrumental não vire tão cedo uma peça de museu.

POR QUE OUVIR ZELI
Instrumentista versátil, Zeli assume a condição de solista, dedilhando seus baixos elétricos de 5 e 6 cordas, além do tradicional baixo acústico. "Em Movimento" confirma a tendência de a música instrumental se aproximar cada vez mais da canção

POR QUE OUVIR ADNET
Arranjador de primeira linha, Adnet se cercou, em "Mvsica", de ótimos instrumentistas, como o pianista João Donato, o saxofonista Teco Cardoso, o celista Jaques Morelenbaum e o acordeonista Toninho Ferragutti, entre outros músicos.

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