Revista Sax & Metais
Relaxe... e toque melhor
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Ano 2006 - nº 2

Além da postura certa e da forma de direcionar o ar,
manter-se descontraído ajuda na hora de tocar

Léa Freire
Ganhei minha primeira flauta aos 15 anos à base de troca - meu pai me deu a transversal, mas pediu a flauta doce - que eu tocava o dia inteiro - em troca... De lá para cá já se passaram mais de 30 anos e as flautas que tive sempre foram grandes companheiras. Gosto da flauta pelo som que produz, é claro, mas também porque é leve, fácil de carregar e a gente pode estar sempre com ela.
Em 2003 comprei minha primeira flauta baixo - soa uma oitava abaixo da "normal" (que eu não sei até hoje como é chamada - flauta soprano? Então a flauta em Sol seria "contrauto" e essa baixo seria na verdade uma tenor? Está vendo como é difícil?). O que sei é que me apaixonei pela flauta baixo e hoje em dia não quero outra outra vida: levo a vida na flauta - baixo. Além do timbre, que é uma delícia, a "bengala" facilita muito na hora de tocar, pois a flauta baixo faz uma curva, parecida com uma bengala, principalmente na postura.

A postura correta é o início de tudo

Tenho reparado em vários flautistas e na postura deles na hora de tocar e me preocupo com esse pessoal ficando todo torto. É preciso prestar atenção à postura para tocar qualquer instrumento, para evitar as tais tendinites e coisa piores como desvios de coluna, etc.
Ao longo desses anos, descobri que o mais legal é sempre menos. Menos esforço, menos tensão, o mínimo movimento dos dedos, o relaxamento máximo do maxilar, a postura mais confortável do pescoço, a boca mais relaxada, a bochecha relaxada, os ombros relaxados - uma perfeita sessão de ioga. Tocamos melhor quando estamos relaxados e a flauta é sensível a qualquer tensão - costuma mudar de oitava - para cima - ao menor sinal de força. Isso ficou claro quando comecei a tocar flauta baixo. Ela é muito mais sensível e essas trocas de oitavas mais comuns - então é preciso relaxar mais ainda -, principalmente para as notas mais graves.. Menos ar, uma coluna de ar mais "larga", faz um som mil vezes melhor do que aquela embocadura tensa que tendemos a usar para a terceira oitava da flauta comum.

Controle a emissão de ar

A flauta é o instrumento que mais desperdiça ar - metade, ou mais, do ar que você sopra acaba indo para fora da flauta, não serve pra nada, só pra deixar agente tonta. Então, o ideal é conseguir colocar a maior parte do ar soprado para fazer som, não pra "babar" a flauta toda. Este é um ajuste milimétrico que só conseguimos tendo a paciência de tocar devagar, senão a tenção vai para os movimentos das mãos, que podem ser extremamente complexos, às vezes...
Para passagens difíceis, um caminho legal é tocar tudo muuuiiiito devagar, tudo ligado, sem golpe de língua, glote, diafragma ou ualquer outro golpe. Quando fazemos isso, ensinamos ao cérebro como é aquela passagem: estamos prestando atenção a cada salto, medindo o esforço necessário e reduzindo esse esforço ao mínimo, ensinando os dedos a se movimentar o mínimo possível, pensando na postura, relaxando o ombro, colocando o punho na posição correta (reto, sempre) - é muita coisa!
Nunca tive nenhum problema de articulação - e toco também piano e violão, que têm posturas e movimentos completamente diferentes, e digito no teclado do computador o dia inteiro, respondendo à e-mails ou escrevendo partituras. Tudo na lei do menos - como diz o samba -, a regra três, onde menos vale mais. Claro que o pessoal que toca sax barítono, contrabaixo, etc. e tem de carregar, toma outras providências também. Fazer uma ginástica básica ajuda muito a coluna. Como na música a pausa é importante, o intervalo na hora de estudar é sagrado - e o alongamento, supernecessário. Muito melhor do que pagar ortopedista, acupunturista, relaxante muscular que dá aquele enjôo, etc.

Escute, ouça e sinta

A coisa de que mais gosto em música é escutar. Escutar buscando entender. Afinal, música é para ser ouvida. Gosto de ver o pessoal tocar também, mas gosto mesmo é de escutar e tentar descobrir o que está sendo tocado, para tocar depois. Escutar envolve um esforço muito grande, sai fumaça da cabeça da gente às vezes, mas percebo que quanto mais escuto, melhor escuto e mais gosto disso. Existem vários métodos de percepção bem legais e, em minha opinião, todo músico deveria passar por esse tipo de treinamento. Seja feito da forma que for, é muito legal poder tocar qualquer música com qualquer grupo ou cantor(a) a qualquer momento sem se preocupar com a partitura. Mas isso é um tema enorme que fica para outra vez.
Como diz um amigo: muita hora nessa calma. A música nos espera e nos agradece se chegarmos de mansinho, sem atropelar.



Quem é Léa Freire:
Flautista e compositora, ouvia desde cedo eruditos brasileiros como Guarnieri, Villa-Lobos, Radamés Gnattali e Souza Lima entre outros, durante seus estudos de piano, quando também conheceu a obra de Bach, Debussy e os muitos autores estrangeiros. Também se interessou pelo rock and roll e depois o jazz, que a trouxe de volta para a bossa nova, que chamou o choro e que mostrou o caminho para os inúmeros ritmos brasileiros. Agora começa uma nova etapa - a de unir o popular ao erudito - o formalismo à improvisação, com sotaque brasileiro.
Já tocou com muita gente como Alaíde Costa, Filó Machado, Nelson Ayres, Marlui Miranda, Hermeto Pascoal, Arismar do Espírito Santo, Yamandu Costa, Evandro (bandolim), Rosinha de Valença, Arrigo Barnabé,
Itiberê Zwarg, Nenê, Nailor "Proveta" Azevedo, Nico Assumpção, Elton Medeiros, Manezinho da Flauta, Guilherme Vergueiro, Michel Freidenson, Leny de Andrade, Bocato, Guello, Mozar Terra e muitos outros representantes das mais diversas tendências musicais.
Lançou seu primeiro CD, Ninhal, em dezembro de 1997, gravado no período de 1994 a 1996 através do selo Maritaca, onde contam participações especiais da Banda Mantiqueira, Quarteto Livre, Joyce, Filó Machado e muitos outros músicos de primeira linha, num total de 51 pessoas entre músicos, arranjadores e compositores.
Em 1998 integrou-se também ao grupo de Teco Cardoso, com o qual fez várias apresentações, inclusive na Universidade de Miami e no Blue Note de Nova York, montando com este um repertório que gerou o CD Quinteto, gravado em Nova York, em outubro de 1999, que contou com Benjamim Taubikin (piano), AC Dal Farra (bateria) e Sylvio Mazzucca Jr. (contrabaixo).
Como produtora e editora de música instrumental brasileira, montou uma gravadora e editora, a Maritaca Prod. Art.

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