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"O baixo em evidência"

Por Fabio Silvestre Cardoso
01/11/2005

Thiago Espírito Santo
O Em seu disco de estréia (Maritaca, 2005), Thiago Espírito Santo não faz pouco de sua linhagem familiar. Este colunista explica. Para aqueles que não fizeram a associação, Thiago é filho de Arismar do Espírito Santo, um dos músicos mais eminentes na seara instrumental, célebre entre seus pares, mas que permanece anônimo para uma vasta fatia dos ouvintes. Assim como o pai, Thiago toca um instrumento cuja relevância não é lá muito notada, principalmente se se considerar o cenário da música pop, que prefere sempre os guitarristas ou os cantores. Dessa maneira, o primeiro destaque vai para o fato de o músico valorizar a música instrumental a partir de seu contrabaixo. Mas há outros, como se verá a seguir.

No álbum, embora a maior parte das músicas sejam oriundas da fusão da MPB com outros estilos, ora mais regionais, ora mais jazzísticos, a peça de abertura é “O cravo bem temperado”, de J.S. Bach. No baixo solo, Thiago mostra aos ouvintes todo o virtuosismo numa interpretação inconfundível. Nota por nota, a interpretação torna-se original graças à natureza melódica que ele imprime ao contrabaixo. Em outras palavras, em vez de adicional, torna-se preponderante. E as variações dos agudos e graves acentuam mais essa marca. Num medley, o ritmo constante é quebrado pelo “Prelúdio nº3”, de Villa Lobos. Propositadamente ou não, o estilo de Thiago Espírito Santo já está sedimentado nessa primeira faixa.

Em seguida, o clássico dá lugar ao popular. Com uma leitura intimista, é a vez de “Caminhos Cruzados”, do maestro Tom Jobim. Novamente sozinho, mas agora, além do contrabaixo, o músico executa ainda o violão elétrico. O contrabaixo não chega a perder espaço, mas a presença do violão pontua mais a participação do outro instrumento. Há, inclusive, uma alternância de lugares: é o violão que acompanha o baixo. Íntimo e pessoal. A partir da terceira música sai de cena o íntimo e pessoal para a entrada do conjunto. É assim que aparecem nomes como Chico Pinheiro ao violão (o mesmo que toca com Maria Rita) e de Raphael Ferreira, ora no sax tenor, ora sax soprano. Com isso, surgem levadas mais animadas, como em “Bárbaro” e em “Thiago” , esta última com a inspirada participação de Bia Góes nos vocais.

E o disco segue alternando a sua feição a cada música. Em “Vó Luíza”, por exemplo, o tom intimista reaparece, mas logo dá lugar ao ritmo regional em “Neném do forró”, que, não por acaso, é dedicada a Dominguinhos (conta, aliás, com a participação dele no acordeon). E vale mencionar ainda o triângulo de Dió de Araújo. Já em “As de Bombacha”, a introdução remonta também ao regionalismo, muito embora o desenvolver da canção o trompete de Daniel D’Alcântara amenize as cores gauchescas. Aqui, Thiago também protagoniza um solo que une as duas partes da música, além de ditar o ritmo das passagens.

Na décima-terceira faixa, “Má Rapaiz”, há o encontro de pai e filho no contrabaixo. E só. Em pouco mais de um minuto, o que se ouve é uma mescla de duelo seguido de pergunta-resposta do mesmo instrumento em duplicidade. Música para músico, ainda que bem elaborada. E para aqueles que, ao final, eventualmente sentirem falta de uma faixa com letra, a última música “Tocar” é uma canção-resposta. O motivo? Basta ler o verso-chave: “Só quem sabe/ É quem sabe tocar”.

E os leitores podem conferir o músico hoje, 01.11, lançando o disco Thiago Espírito Santo no recém-inaugurado espaço do Tom Jazz.

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