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"A variedade da música brasileira abre espaço para todas as vertentes"
por Evanize Sydow
10/07/2002

Show de um intérprete que tenha o acompanhamento da flauta mágica de Léa Freire é garantia de bom espetáculo. Seus solos são inspiradores e, invariavelmente, causam frisson na platéia. Léa também é compositora, geralmente gravada pela cantora Joyce em países como Japão, Alemanha e Inglaterra, e proprietária do selo Maritaca, sobre o qual fala nesta entrevista concedida para a Página da Música. Estão na lista de importantes nomes com quem já tocou Alaíde Costa, Nelson Ayres, Elton Medeiros, Leny Andrade, Jaques Morelenbaum, Isaurinha Garcia, Carlos Poyares e Arrigo Barnabé.
Atualmente, a instrumentista está em estúdio gravando o seu próximo CD, que sai pela Maritaca no segundo semestre. Com uma agenda privilegiada (acompanhe abaixo a programação), a artista falou sobre a vida de empresária, a história do selo e os projetos atuais. Acompanhe.

Página da Música - Queria saber sobre a história da Maritaca. Por que você resolveu montar o selo? Qual é a história da gravadora?

Léa Freire - Resolvi montar um selo por vários motivos. Primeiro porque hoje a nossa tecnologia permite fazer música num preço que antigamente só era suportado por grandes companhias. Possibilitou que vários selos independentes surgissem no mercado. Outro motivo foi porque eu sempre senti muita falta no mercado brasileiro de música de qualidade. Sempre, dos anos 70 para cá, o nível da música brasileira gravada pelas grandes gravadoras ficou muito aquém daquilo que eu queria ouvir e senti falta no mercado de música de qualidade. Sendo músico, sei que existe um monte de compositores maravilhosos e músicos sem espaços para gravar. E terceiro porque me formei em Administração de Empresas, fui diretora financeira durante dez anos e resolvi juntar as duas carreiras. Resolvi fazer um selo e editora. A editora porque não só não existe música brasileira gravada como não existe partitura.

PM - Há quanto tempo vocês estão no mercado?

LF - A Maritaca começou a funcionar no final de 1997. Há cinco anos.

PM - Vocês têm uma linha instrumental. Têm intenção de um dia mudar essa linha?

LF - Eu não acho que voz não seja instrumento. Já me perguntaram porque a Maritaca é um selo exclusivamente instrumental. Eu não tenho nada
contra gravar cantor. A única coisa é a qualidade da música a ser gravada.

PM - Quem distribui é o Núcleo Contemporâneo, que também tem uma linha muito parecida, no sentido de produzir música instrumental.

LF - Mas eles também gravaram Ná Ozzetti.

PM - Como vocês firmaram essa parceria sendo dois selos que têm uma mesma linha, ou seja, que teoricamente são concorrentes?

LF - Somos parceiros. Na verdade quem compete são as grandes empresas.
Um não sobrevive sem o outro porque a música existe e tem que ser divulgada.
O Teco (Cardoso) e o Benjamim (Taubkin) são meus amigos de infância, a gente tocou junto durante muito tempo e não tenho o que competir com
eles. A idéia não é essa, a idéia é somar.

PM - Os CDs são vendidos na internet ou tem uma outra forma independente de comercialização?

LF - Tem alguns sites que vendem. O Núcleo Contemporâneo tem uma lista das lojas para onde eles distribuem e eles estão pensando em entrar no mercado eletrônico, mas isso é complicado.


Títulos do selo Maritaca

PM - A Maritaca tem quantos títulos?

LF - A Maritaca é pequenininha, tem três CDs e um livro. Este ano nós vamos lançar mais um CD e um livro.

PM - Quais são os CDs que vocês já produziram?

LF - "Ninhal" (Léa Freire), "Piano à Brasileira", da pianista Silva Goes, fazendo praticamente todo o disco de piano solo. Nossa! Que dificuldade para achar um piano em estúdio aqui em São Paulo... O terceiro CD é do Tibô Delor, que é um contrabaixista francês que fazia música da melhor qualidade, acabou ficando por aqui e se apaixonou por Tom Jobim. Agora, estou terminando de fazer a produção do novo CD do Arismar do Espírito Santo e do livro de partituras.

PM - E os próximos lançamentos?

LF - Arismar (do Espírito Santo), o do Mozart (Terra) e o meu, que comecei a gravar em primeiro de julho.

PM - Qual é a dificuldade em ser artista na hora de montar um selo?

LF - Eu só estou somando as minhas duas carreiras. O horário é complicado porque sendo músico você tem que estudar. E ao mesmo tempo você tem que fazer toda a história da burocracia da divulgação, dos telefonemas, enfim... Essa experiência tem sido compartilhada com quase todos os selos independentes do Brasil, mas como a mulher já faz dupla jornada... (risos). Essa história de globalização, foi só um nome que deram para "você vai ficar sem emprego". E aquele que ficou com emprego tem que chutar com a mão, com o pé, com o nariz. Eu acho que esse é um erro fundamental porque você desgasta seus melhores recursos e todo mundo vai enlouquecendo. Aí começa a aparecer livro de auto-ajuda, porque ninguém aguenta um tranco desse.

PM - Como funcionam os contratos? Vocês têm um casting?

LF - Os contratos são específicos para o CD. Não envolve um longo prazo.
O único compromisso que o selo tem é de manter os itens em catálogo e dependendo do artista você faz um acordo com ele. Esse contrato é para aquele trabalho específico. A gente produz alguns eventos para os artistas também.
Os poucos espaços ainda para a música instrumental na mídia precisam ser aproveitados à exaustão.

PM - Vocês são bastante procurados pelos artistas?

LF - Eu recebo muita coisa. Algumas coisas não têm muito o estilo da gravadora, mas são coisas excelentes. Nem sempre a gente pode produzir tudo o que gostaria. O Brasil é muito rico de música boa. A gente tem que fazer malabarismo.

PM - Quais são os seus projetos como instrumentista atualmente?

LF - Eu acabei de chegar de Brasília tocando com Arismar do Espírito Santo e Silvia Goes no Clube do Choro, que é uma iniciativa maravilhosa do pessoal de Brasília. Eles fizeram o Clube do Choro, que já tem nove anos e hoje a TV Senado e a TV Câmara colocaram as apresentações em suas grades de programação. Lá eu já aproveitei para falar com o pessoal de livrarias etc. Agora, começo a gravar meu CD. Vou para o Festival de Jazz de Ipatinga, em Minas Gerais. Eu tenho muita sorte. Toco com pessoas de quem eu gosto muito, como o Arismar, Silvia Goes, Tibô Delor, e até acabei produzindo esses sons porque eu gosto muito de tocar com eles. Mas também toco com gente que é produzida por outros selos, como Celso Pixinga.

PM - Você compõe também.

LF - Sou compositora. A Joyce gravou uma música minha agora.

PM - Que, aliás, é muito bonita. Esse seu próximo CD já tem nome?

LF - Não, mas ele é um projeto mais camerístico. Tem o Tibô, que é músico mais erudito, o Rogério Bocatto, que é da Jazz Sinfônica e toca com Toninho Horta, o Felipe Senna, um pianista novo que é um excelente músico. Tem um povo maravilhoso que eu não sei de onde brota tudo isso. A maravilha de você não ter um conservatório. Como definiu o Carlos Galvão, diretor da escola de música de Brasília: "O nome conservatório é para conversar coisas, transformar a escola num freezer". E o Brasil é um país enorme com uma variedade de música, regionalmente falando, impressionante, que abre espaços para todas as vertentes.

PM - Acho que isso justifica um pouco esse grande número de selos independentes.

LF - Isso é a maioridade do músico, de tomar as rédeas da própria vida nas mãos e não ficar esperando que o governo ou a gravadora ou sei lá quem interfira neste processo.

PM - Inclusive dá espaço para estes músicos que você está falando. Cada um abre espaço para os que conhece, porque se você for depender da gravadora ninguém faz mais nada...

LF - E eles estão fazendo uma coisa tão pasteurizada, onde a qualidade é tão menosprezada, que ninguém está preocupado com a qualidade da música, do som que vai ouvir nem nada.

PM - O caminho parece ser cada vez mais o independente mesmo.

LF - Com certeza. A música é artesanato e a internet está se tornando um grande divulgador. O quarto poder, que é a mídia, está e sempre foi comprometido com os seus financiadores. Isso faz o maior sentido. Agora, com a internet tão barata, todo mundo usa, você pode acessar muita gente. A nova mídia, que é a internet, possibilitou um novo espaço de divulgação, onde não há esse poder todo. Aí já começaram os movimentos e os famosos do pop dos Estados Unidos não querem mais esses contratos leoninos, mesmo porque a gravadora é da rádio ou da televisão.

PM - Entrevistando o Roberto Menescal ele falava que os meios de comunicação deles (a gravadora Albatroz) são os veículos alternativos; eles não contam com os programas de domingo na televisão.

LF - Exatamente. São os sites como a Página da Música e outros que fazem crítica não só no Brasil, as TVs Cultura, Educativa, Senac e as do governo, TV Senado e TV Câmara. São os que estão dando espaço.


Site Maritaca: www.maritaca.art.br

dia 7 - Léa Freire, Teco Cardoso, Benjamim Taubkin, Sylvio Mazzuca Jr. e AC Dal farra
dia 14 - Mozar Terra e Grupo
dia 21 - Tibô Delor
dia 28 - Silvia Góes
Sempre às 18h
Livraria Cultura - Shopping Villa Lobos - Av. Nações Unidas, 4777
Tel. (11) 3024-3599
Grátis

Léa Freire
dia 9, às 21h
Villaggio Café - Praça Dom Orione, 298, Bela Vista
Tel (11) 251-3730
Couvert artístico R$ 10,00

Léa Freire, Tibô Delor, Delipe Senna e Rogério Bocatto
dia 10, às 21h30
Bar Las Artes - Rua Wisard, Vila Madalena, São Paulo

Léa Freire, Arismar do Espírito Santo, Silvia Góes e Toninho Pinheiro
dia 12
Centro Cultural da Usiminas - Shopping Vale do Aço, Ipatinga, Minas Gerais

Léa Freire, Arismar do Espírito Santo e Silvia Góes
dia 21, às 16h
Rua do Choro - Praça Júlio Prestes, s/n, Luz, São Paulo

Léa Freire, Tibô Delor, Felipe Senna e Rogério Bocatto
dia 30, às 22h
Villaggio Café - Praça Dom Orione, 298, Bela Vista
Tel (11) 251-3730

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