Revista Weril
- 04/2002
"entrevista Léa Freire"

Quem grava, ou já gravou CDs com o selo Maritaca?

O primeiro CD da Maritaca foi o "Ninhal", lançado em 97, um CD com músicas de minha autoria e participações especiais de Joyce, Filó Machado, Banda Mantiqueira, Quarteto Livre, num total de mais de cinquenta músicos. Em 2001 a Maritaca lançou os CDs "Piano à Brasileira" com composições da pianista Silvia Góes e mais uma releitura de Tico Tico no Fubá, de Zequinha de Abreu e "No Tom da História" com o contrabaixista Tibô Delor, somente com composições de Tom Jobim e participação especial de Paulo Jobim. Atualmente estou terminando o novo disco de Arismar do Espírito Santo, grande contrabaixista, baterista, guitarrista, violonista, pianista, compositor, enfim o cara é multi. A Maritaca também é editora e lançou no ano passado o primeiro livro de partituras da série “Música Instrumental Brasileira”, com as músicas do CD “Quinteto”, meu e do Teco Cardoso. Este ano pretendemos lançar o nr 2 dessa série com as obras de Mozar Terra no CD “Caderno de Composição”.

Qual o procedimento e material necessário para se gravar um CD?
Qual dica você daria para aqueles que pensam e concluir seu trabalho em um CD?

Primeiro é preciso saber exatamente o que se vai gravar - que tipo de música, quais instrumentos, quantos instrumentos. O melhor é estar tudo ensaiado para evitar gastos desnecessários com horas de estúdio. Daí procurar um estúdio que melhor atenda às necessidades da gravação (por exemplo : se precisa de piano acústico a procura por um estúdio pode ser desesperadora...) - sala separada para bateria, ou vai gravar ao vivo - essas coisas - porque um instrumento "vaza" no outro e aí não dá para fazer edições ou regravações. Tudo isso pensando na "cara" que o CD vai ter - se você pretende uma cara mais "ao vivo" é melhor gravar todo mundo junto, senão você pode ir gravando um instrumento de cada vez, refazer os solos se achar melhor. Definido o estúdio é bom ter uma ordem de gravação para poder agendar os horários disponíveis dos músicos para não desperdiçar o tempo de ninguém. O formato da gravação hoje usa DAT, ADATs, DA88 ou direto no Pro Tools, tudo digital. Pessoalmente ainda prefiro o sistema analógico, mas o digital tem evoluido muito e foi o barateamento de custos proporcionado pelo sistema digital que possibilitou que os independentes aparecessem. Não se pode esquecer do direito autoral, de execução e conexo. Para o direito autoral ser respeitado é necessário que os autores ou editores que os representam autorizem a reprodução da obra. Para isso é necessário entrar em contato com o ECAD e solicitar os dados necessários para conseguir as autorizações, mesmo porque as fábricas não podem prensar os CDs sem essas autorizações. Para fins de direitos de execução e conexos é necessário preencher as fichas do GRA para cada faixa do CD, especificando obra, autor, data e tipo de gravação, músicos executantes, músicos intérpretes, etc. As Sociedades Arrecadadoras tipo a SICAM, podem dar maiores explicações de como fazer essa ficha. Os dados autorais e o GRA devem constar da capa do CD para que o ECAD possa recolher e pagar os direitos referentes ao fonograma. O GRA também diz quem é o produtor musical, que também recebe uma porcentagem sobre a execução e a venda.
Enfim, fazer um CD é possível mas exige uma série de procedimentos burocráticos.
A parte final é fazer a mixagem e a masterização em estúdios de sua confiança e que tenham os requisitos técnicos necessários para que o som final do CD seja o melhor possível.
Escolher uma boa fábrica para a impressão (os dados dessa fábrica devem constar no fotolito da capa e do CD). Cuidar para que a capa e o encarte tenham uma apresentação bem bacana e ter um distribuidor de confiança que venda nas lojas pelo Brasil. Ufa ! Dá um trabalhão !

Atualmente, a gravação dos discos independentes são uma realidade?

Com certeza. Todos os dias tem gente lançando trabalhos novos independentes. Outro dia saiu uma matéria no Estadão sobre os novos selos, do Rui Castro. Ele disse que em número de CDS, as independente são responsáveis por menos de 10% do mercado, mas em número de lançamentos, ficam com 90% dos títulos, e 95% dos lançamentos de qualidade ! Não é fantástico ?

Como são as gravações com os instrumentos de sopro especificamente? Possuem algum tipo de acompanhamento? Eles encontram espaço no mercado musical?

Os instrumentos de sopro gravam tanto como solo quanto como acompanhamento. Quando existe um arranjo para instrumentos de sopro, eles funcionam como uma "cama" harmônica para valorizar o solista, seja este um cantor ou qualquer outro instrumento. Isso é muito fácil de notar nas famosas BIG BANDS, com aqueles arranjos para metais super suingados ou, como se diz no jargão, aquelas "bolachas" (notas longas) que caminham junto com a harmonia. Enquanto solistas, a função dos instrumentos de sopro é super variada, e pode ser escutada em todo tipo de música - no choro, por exemplo, a flauta é muito utilizada como solista, já no jazz o saxophone é a marca registrada. Existe espaço no mercado para pessoas dedicadas e talentosas que se destacam de alguma maneira. Apesar de a mania do "sampler" ter diminuido o mercado, os músicos de sopro de primeira linha continuam gravando e tocando por aí, porque o computador ainda não consegue substituir uma boa interpretação.

Entre as músicas instrumentais, os instrumentos de sopro possuem algum destaque?

Na música instrumental o legal é que o destaque é de instrumentos e instrumentistas, todos os tipos de instrumento podem ser valorizados, dependendo do arranjo. Acho super interessante quando aparecem novas formações, misturando instrumentos antes considerados incompatíveis entre si e em relação ao tipo de música sendo tocado. Adoro ver violinos tocando baião.

Como estão o nível das gravações brasileiras? E dos músicos brasileiros?

As gravações de música instrumental brasileira estão evoluindo muito rapidamente, conforme a experiência dos novos selos e dos estúdios que trabalham com eles está crescendo. O músico brasileiro está tomando as rédeas da própria carreira, o que eu acho ótimo, e tende a evoluir cada vez mais, abandonando aquela atitude adolescente de reclamar de tudo e não fazer nada.

Existe outra gravadora com o mesmo perfil da Maritaca, que fortalece e divulga a música instrumental brasileira?

Existem vários selos assim. Em São Paulo o Núcleo Contemporâneo e a Pau Brasil, entre outras. No Rio tem a Biscoito Fino e a Vison. Em Minas tem a Terra dos Pássaros, do Toninho Horta. Enfim, elas existem e novas estão aparecendo em todo o Brasil. Ainda bem !

Sabemos que após um longo período longe da música, você decidiu voltar a este mundo e dedicar-se ao selo. Como acha que sua formação musical contribuiu na criação do Maritaca?

Acho que é essencial a formação musical para qualquer pessoa mesmo. Pro carteiro, motorista de ônibus, ascensorista, advogado, polícia, todos. Mais ainda se a pessoa vai trabalhar no meio musical. Acho essencial que técnicos de som, produtores, jornalistas da área de música, DJs de rádio e TV, tenham formação musical. Isso facilita tudo e é o que acontece na Europa e EUA. Quanto ao periodo em que estive fora da música, aproveitei para aprender bastante sobre administração, gerenciamento, finanças, impostos e outras coisas importantes para gerir uma empresa.

Como está hoje sua carreira de flautista e ao mesmo tempo produtora?

É corrido, o tempo é escasso, mas, ao mesmo tempo, uma coisa puxa a outra e quanto mais você faz, mais quer fazer, e isso é, pra mim, o máximo. Estar na ativa fazendo o que gosto, e bastante ! Tenho tocado bastante e produzido muito. Agora em Abril vou estar todas as segundas feiras no Supremo, fazendo "O Som da Maritaca", com os artistas do selo. Dia 1º de Abril tem o Quinteto, fazendo a divulgação do livro de partituras do CD; dia 08 de Abril tem show com o Octeto do Mozar Terra; dia 15 tem Tibô Delor quarteto; dia 22 Silvia Góes Trio e dia 29 Arismar do Espírito Santo e Sexteto. Queria aproveitar para convidar todos os seu leitores, vai ser uma festa.

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