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- 06/07/2005
"Meu trabalho é te traduzir"

Por Julio Daio Borges

Dentro do quase boom de talentosos pianistas brasileiros, como Marcos Nimrichter e Leo Mitrulis, surge também Heloísa Fernandes com seu CD Fruto, pela gravadora Maritaca. A exemplo de seus habilidosos colegas de instrumento, Heloísa tem a abertura, antes praticamente inédita, para rechear o álbum de composições próprias, alternando uma ou outra interpretação de outro autor. No caso, “Rosa”, conhecidíssima, de Pixinguinha, e uma esplendorosa versão de “Trilhos Urbanos”, de Caetano Veloso. Talvez para nos lembrar que, antes de personalidade midiática (e “multimídia”), Caetano foi compositor, e dos bons. Por mais que seja injusto com a produção da própria Heloísa, “Trilhos Urbanos”, talvez por ser, exatamente, conhecida, nos oferece uma chave de interpretação, para seu trabalho, como poucas. Ela recria o tema de Caetano Veloso em crescendos e diminuendos, oscilando entre a pujança da “banda toda” (ainda que nesta faixa específica esteja apenas acompanhada do percussionista Ari Colares) e o minimalismo de execuções quase infantis (não é à toa que ela dedica o disco a seus filhos, “total inspiração” e “razão de vida”). Aliás, se vale aqui uma crítica – não para “Trilhos Urbanos” e, sim, para as demais– ela se coloca no sentido de que, a exemplo de Heloísa, os nossos instrumentistas, e principalmente os nossos instrumentistas-compositores, deveriam tentar recuperar a noção perdida de melodia, hoje meio escondida entre “climas” e “ambiências” sedutores, e até bonitos, mas restritos, precisamente, ao registro autoral. Mesmo tendo domínio completo de sua ferramenta, às vezes parece que nossos artífices são incapazes de legar uma frase, um – vá lá – refrão, uma – pecado! – canção. É provável que isso guarde relação com a hoje quase extinta forma-canção... (mas fica pra outra tertúlia). Louvamos, então, Heloísa e sua realização – tão grande e elogiável quanto a de seus predecessores (ou colegas, melhor dito) – mas gostaríamos que se tomasse a composição, novamente, como diálogo com o público. Coisa que os compositores populares, inclusive, compreenderam (e assimilaram), até demais. Como Caetano Veloso – melhor quando tímido do que quando espalhafatoso.
>>> Fruto - Heloísa Fernandes -
Maritaca

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