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Jornal O Tempo
Tributo sinfônico à música popular
por: Júlio Assis
BH 16.07.2007
Flautista, compositora e arranjadora Léa Freire lança
Cartas Brasileiras, em que dá tratamento camerístico a ritmos brasileiros
A flautista, compositora e arranjadora paulista Léa Freire chama de fauna musical brasileira a sua fonte inesgotável de pesquisa artística. Ela refere-se à infinidade de manifestações musicais presentes no país. De formação erudita - antes da flauta, estudou piano - leva esses ritmos nacionais ao campo camerístico e sinfônico com um requinte peculiar. "A idéia é criar uma sonoridade erudita brasileira", diz Léa, proposta que pode ser degustada no CD "Cartas Brasileiras", o quinto da carreira, que ela lança pelo seu próprio selo, o Maritaca. Com 11 composições autorais, o disco tem direção musical de Teco Cardoso e regência do maestro Gil Jardim. Contou com a participação de 66 músicos, e a presença da cantora Mônica Salmaso no vocalise de "Espiral", nesta faixa acompanhada apenas ao piano pela própria Léa Freire, que toca flauta em algumas outras músicas. "Foi um desafio grande escrever para orquestra e acompanhar tudo, da execução dos arranjos a detalhes da produção, por isso não toco em todas as faixas, tive que fazer uma opção", explica ela. Os instrumentistas são oriundos das sinfônicas do Estado de São Paulo (Osesp) e da Universidade de São Paulo (USP) e também da Orquestra de Câmara da USP. Entre os músicos convidados, o saxofonista e arranjador Nailor Proveta, o violonista Paulo Bellinati e os pianistas Paulo Braga e André Mehmari. "É uma honra ser contemporânea dessa geração da música brasileira", diz Léa, cada vez mais convicta da riqueza da nossa musicalidade. "Tive certeza disso quando passei uma temporada nos Estados Unidos e voltei para não sair mais", afirma. No CD "Cartas Brasileiras", ela buscou um mapeamento, uma cartografia livre de ritmos brasileiros. Na faixa de abertura, "Vento em Madeira", há uma sinfonia com um leve baião percussivo. Há ainda choro, samba-canção, maxixe, valsa, tudo permeado com tratamento camerístico e, como a própria artista ressalta, "sem confundir fusão com confusão". As composições são de épocas distintas do baú de Léa, que ela decidiu reunir neste projeto que também comemora os 50 anos de vida da flautista e os dez anos do selo Maritaca. "A mais antiga é ‘Nove Luas’, que compus há cerca de 20 anos, e a mais nova é ‘Espiral’, feita seis meses antes de gravar", conta ela. As gravações ocorreram em alguns períodos de 2005 e também em 2006. O lançamento só agora, segundo Léa, não tem nenhuma razão especial. "Fomos cuidando sem pressa da finalização, do encarte", relata. Este aliás, mereceu tratamento especial em design gráfico de Marcílio Godoi. Cada faixa tem no encarte uma breve história escrita pela própria Léa Freire. É assim que ficamos sabendo por exemplo, que o maxixe "Bis a Bis" é uma homenagem às duas avós da artista, que se falavam de janelas próximas. "Falavam uma da outra ou, ambas, de alguém desavisado. Havia música naquilo, como duas tias discutindo no alpendre", escreve Léa, para o que corresponde à altura o travesso arranjo de Luca Raele para uma formação de requinta, clarone e clarinete. Em "Cartas Brasileiras", repousa, enfim, uma bela forma de fazer música brasileira sem distinção entre erudito e popular.
AGENDA - "Cartas Brasileiras", de Léa Freire. Lançamento Maritaca. Preço médio: R$ 30.
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